quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

"Misto de Goebbels e Estaline"


O Portugal do séc. XVIII é quase inseparável da figura dominadora do marquês de Pombal (1699/1782). Para alguns, Pombal, que para todos os efeitos governou Portugal entre 1750 e 1777, é uma grande figura do absolutismo iluminado, comparável a Catarina II da Rússia, a Frederico II da Prússia e ao imperador José II da Áustria; para outros não passa du filósofo imaturo e dum completo tirano. Os contemporâneos já estavam divididos acerca de Pombal, mesmo antes  de ele ter chegado ao poder.(...)
Entre 1739 e 1743, o futuro marquês de Pombal representou o rei de Portugal na corte de St. James. (...) Sebastião José de Carvalho e Melo sentia-se ofendido pela forma displicente como os Britânicos encaravam a aliança anglo-portuguesa. (...)
Em 1742 Pombal escrevia que "todas as nações da Europa se aumentaram e aumentam ainda hoje pela recíproca imitação. Cada uma vigia cuidadosamente sobre as acções que obram as outras...".
Os assuntos relativos à possessões portuguesas na Índia também foram uma preocupação sempre presente durante a estada do futuro marquês em Londres. Os maranatas tinham tomado a ilha de Salsete e Goa estava cercada. Pombal procurou obter auxílio do governo britânico, mas a East India Company opôs-se a que fosse prestada qualquer ajuda aos portugueses, e não se mostrou contrária à ideia da sua expulsão total e definitiva dos territórios de que ainda dispunham na Índia. D. João V ainda mandou um esquadrão da Marinha, que chegou demasiado tarde para evitar a tomada de Salsete e de outros postos avançados dos portugueses na região de Bombaim. (...)
Na realidade, a colocação junto da corte austríaca foi o impulso decisivo da sua carreira. Chegou a Viena, via Londres, em 1745. Apesar de se queixar constantemente, a sua actividade na capital austríaca conheceu êxitos assinaláveis. De acordo com o ministro francês, a actividade do enviado português em Viena, "pela competência, verticalidade, e especialmente pela grande paciência, merecia elogios de toda a corte".
Contudo, apesar de toda esta animação intelectual, perante o resto da Europa de meados do séc.XVIII, Portugal tinha uma imagem muito negativa; mas foi este o País que Pombal teve que governar durante quase três décadas. Qualquer racionalista da centúria de Setecentos que precisasse dum estereótipo de superstição e atraso, voltava-se invariavelmente para Portugal. Voltaire resumiu bem esta atitude. Ao escrever sobre D.João V, o monarca português enriquecido pelo ouro do Brasil, observou: "Quando quis uma festa, mandou fazer uma procissão. Quando quis um edifício novo, mandou fazer um convento. Quando quis uma amante, escolheu uma freira". (...)
Em 1750, numa população inferior a três milhões de pessoas, havia em Portugal um verdadeiro exército de clérigos, que, de acordo com algumas estimativas, tinha duzentos mil efectivos. Em 1780, o número de conventos e mosteiros chegou aos 538. Charles Boxer chamou ao Portugal de Setecentos "o país mais infestado de monges em todos o mundo, com a possível excepção do Tibete". (...) A tortura e a destruição em público de membros de duas das mais distintas famílias de Portugal, acusados de atentarem contra a vida de D.José I, o famoso processo dos Távoras, chocaram os estrangeiros de forma especial, embora seja de notar que a consternação foi menos causada pela tortura do que pelo facto de as vítimas serem aristocratas. (...)
Os historiadores portugueses concordarão que o Portugal de Setecentos foi governado por um regime absolutista. Foi porém um regime inspirado pelo absolutismo da Razão, pelo que o seu autoritarismo foi essencial para o Governo poder restabelecer o controlo sobre a economia e revitalizar o Estado.(...)
Um dos exemplos mais notáveis desta actividade foi o assalto planeado contra os jesuítas. A administração pombalina fomentou e subsidiou uma campanha virulenta contra a Companhia de Jesus por toda a Europa. (...)
Para os que possam pensar que estas lutas acerca da memória histórica estão ultrapassadas, aconselhamos a leitura do número da Revista jesuítica Brotéria, de Lisboa, publicado em 1982, para comemorar o bicentenário da morte do Marquês de Pombal: "Tal era a espantosa máquina de propaganda montada por Portugal, e que nada fica a dever às congéneres contemporâneas. Às de Goebbels e de Estaline, por exemplo." E o artigo de fundo continuava: "Misto de Goebbels e de Estaline era ele, de facto, avant-la-lettre". (...)

Sobre o Camilo crítico, analista, patriota... estamos conversados! Sobre o Marquês governante... que poderia ele ter feito dum país assim, sem esmagar os interesses duma aristocracia parasita centenar? Sobre o Sócrates... cá estamos à espera, atentos. Sobre a nossa língua portuguesa... Camilo ainda é mestre.